Olinda Castilho Escobal, de São Paulo, tem 81 anos e não vê a hora de chegar a festa de Natal, para comemorar com a família.

“A gente é bem entrosado, eu com meus filhos”, contou à Agência Brasil. “A gente sempre faz festa, comemora aniversários, sai e vai para restaurantes. A gente é bem animado”.
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Para o Natal 2025, ela vai fazer uma “pizzaiada” na véspera e um churrasco no dia 25. “Meu filho montou a churrasqueira para churrasco e pizza. Ele fez uma cobertura e nós vamos passar todos aqui na minha casa”.
Somando os três filhos, dois netos, a bisnetinha de 2 anos, nora e genros, serão ao todo dez pessoas, incluindo a própria anfitriã.
Tania Santana Madalena, de 80 anos, moradora do Rio de Janeiro, também reúne filhos, genros, nora e netos para todas as festividades, repetindo um hábito que começou ainda jovem, quando ela e as cunhadas levavam os filhos pequenos na casa da sogra aos domingos.
“Os nossos filhos foram criados como irmãos e foram se acostumando, junto aos mais velhos também. Sempre foi assim”, disse à Agência Brasil. Na véspera do Natal, as famílias passavam as festas na casa da mãe dela e, no dia do Natal, com a sogra. O mesmo costume se mantém até hoje, reunindo pessoas de todas as gerações.
As festas de fim de ano devem ser momentos de integração e troca entre gerações, ressaltou à Agência Brasil a psicóloga e membro da Comissão de Formação Gerontológica da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG), Valmari Cristina Aranha Toscano.
“Na verdade, essa época é cheia de significados afetivos para todas as pessoas, principalmente para as mais velhas, porque tanto é uma época de encontrar familiares, de poder retomar e construir memórias, como é um momento em que as famílias se reencontram. Mesmo as pessoas que não têm muita frequência no dia a dia, ao menos uma vez ao ano, nas festas, elas se encontram”.
A psicóloga destaca que, além das questões positivas, esse é um momento em que também as ausências ficam mais latentes.
“As pessoas se lembram dos que não estão presentes, seja pela questão real de uma perda por morte ou por ruptura, por viagem. E as pessoas idosas participarem é muito importante, não só como convidadas ou como figurantes, mas também como participantes ativas e protagonistas desse evento”, sugeriu.
Valmari Toscano argumentou ainda que, embora, naturalmente, os mais jovens assumam as responsabilidades de comprar presentes ou preparar determinado prato, “é de extrema importância que as pessoas idosas, principalmente as mais longevas, sejam incluídas e se sintam pertencentes ao grupo familiar”.
“O contato com a família é sempre importante mas, nesta época, é essencial, pois é tempo de encontro de gerações, retomada de tradições familiares e construção de novas memórias”.
Reminiscências
Ainda que o idoso não tenha mais a mesma condição de tomar as rédeas da cozinha ou da decoração, é importante que possa opinar, que possa fazer um prato especial, para que algo da sua autoria fique marcado.
“A gente ouve muito ‘minha avó fazia o pudim x, hoje ela não consegue fazer, mas vai ditando’. Ela fica junto quando nós fazemos e é um momento de integração. É o momento das pessoas estarem próximas e criarem ali algumas experiências de troca, principalmente para as gerações mais novas que têm a oportunidade de conviver com essa memória”, acentuou Valmari.
Mesmo que nos dias de hoje, em que se obtém a receita que se quer a um simples toque de dedos, a especialista ressalta que que é especial o “pudim da minha vó” ou “o peru com o molho que a minha mãe fazia”. E essas reminiscências, essas biografias, vêm à tona nas experiências conjuntas entre as gerações.
Com todo mundo preso nos celulares e na internet, há um distanciamento muito grande entre as pessoas da própria família. As festas de Natal e Réveillon, mesmo ocorrendo apenas uma vez ao ano, são oportunidades de as famílias conviverem mais proximamente.
“Ou seja, terem um contato físico mais próximo. Porque a gente tem a ideia, pelo uso da tecnologia, que você sabe da pessoa, que você fala com ela, porque tem acesso muito rápido. Mas não tem a presença, o contato físico e esse é um contato efetivo. Porque não adianta estar todo mundo no mesmo espaço, mas cada um no seu ‘smartphone’”.
Daí, a importância da construção da ceia, do almoço, dos rituais que são próprios de cada família, disse a psicóloga.
“Esses dias, eu escutei no consultório uma família de ascendência italiana que se reúne uma semana antes para começar a preparar os pães que vão ser consumidos, temperar a alcachofra que vai ser feita em conserva no dia. Esses rituais de preparação devem ser mantidos porque preservam os laços familiares”.
Quebrando o gelo
Valmari apontou que a construção das ceias, desses rituais, tira as pessoas dos seus espaços individuais, dos seus mundos privados. A realização de uma festa de amigo secreto, por exemplo, “quebra o gelo” entre pessoas e provoca sua interação umas com as outras.
Embora seja também uma tentação de “lavação de roupa suja”, o importante é fazer dessa reunião um momento de as pessoas serem mais tolerantes, pacientes. “Acho que a gente brinca até um pouco com isso, mas não é o momento de você resolver pendências de uma vida toda, de ressentimentos”, afirmou.
Para a especialista, deve-se evitar que esses ressentimentos, ou que acertos de contas, sejam feitos nesses rituais.
“Acho que deveria haver muito mais um incentivo para que exista um projeto de futuro, como o dia do perdão dos judeus”.
A psicóloga da SBGG acredita que o correto seria as pessoas fazerem um balanço do ano que está findando, uma lista de perspectivas para o futuro.
“A ideia é não criar listas para o outro, mas suas próprias listas, o que você quer que se transforme e o que você faz para isso”.
Ela recomendou também que se deve ter em mente que, em uma reunião desse tipo, em que várias pessoas estão juntas, convém evitar alguns assuntos como política e religião, para evitar brigas, discussões e acabar transformando o encontro em um campo de batalha.
Relembrando histórias
Valmari sublinhou a importância de se usar esse encontro de fim de ano para celebrar o que se tem em comum, relembrar histórias, rituais, trazer à tona a experiência daquele contexto familiar, daquelas pessoas, lembrar o que já foi engraçado, o que já foi superado.
E não usar esse espaço para criar expectativa de resolução como, às vezes, se vê muitas pessoas fazerem “Ah, mas meu filho nunca vem, na hora que ele vier, ele vai ver. Isso está fora de cogitação, porque afasta as pessoas”, afirmou.
A ideia é que essas reuniões sejam práticas e constituam oportunidades de aproximação, de perdão, de reconciliação.
“É um momento de brincar, usar o espírito natalino, acalmar os ânimos. Faça aí uma experiência muito mais de autorreflexão do que de cobrança do outro. Muita gente usa, às vezes, esses espaços para essas disputas”.
Saúde mental
A psicóloga garante que a integração de gerações faz bem à saúde mental de todos. Valmari lembrou também que, nas festas de final de ano, as pessoas não devem ficar sozinhas.
“Nem todo mundo tem família ou vínculos preservados com a família. Mas família não é só quem tem o mesmo sangue da gente. Existem grupos familiares e sociais. Quantas vezes você vê pessoas que se agregam para passar as festas juntos? É um momento de confraternização. Às vezes, você mesmo não tem família, mas tem um grupo de amigos muito ativos”.
Ela acrescentou que, no caso de pessoas mais longevas, dificilmente uma com 80 e poucos anos vai ter um grupo de amigos octogenários ou nonagenários, mas há pessoas com as quais convive, afilhados, vizinhos.
“A gente vê experiências das pessoas que comemoram no mesmo andar, que vão com o grupo da academia, da igreja, do trabalho voluntário. O importante é não estar sozinho, porque é uma época que remete muito a essa ideia da confraternização, do agregar pessoas. Então, para quem é solitário, essa é uma época muito difícil, muito triste”.
Quando perceber que tem alguém do seu círculo que está sozinho que vai passar a data sozinho, convide, propôs a psicóloga.
“Traga para o seu seio, porque, às vezes, até dilui as polaridades familiares. Se tiver alguém de fora, a família segura a onda. Funciona também para trazer uma experiência diferente, uma energia diferente”.
A ideia da solidariedade é muito boa também para o nosso psíquico, destacou. “É você poder oferecer alguma coisa boa a alguém e sem esperar receber dessa mesma pessoa, em troca”.


